Breve Histórico
A internação de pessoas portadoras de transtornos mentais no
Brasil remonta à metade do Século XIX. Desde então, atenção aos portadores de transtornos
mentais foi sinônimo de internação em hospitais psiquiátricos especializados. A
oferta desse atendimento hospitalar concentrou-se nos centros de maior
desenvolvimento econômico do país e deixou vastas regiões carentes de qualquer
recurso de assistência em saúde mental.
A partir dos anos 70, iniciam-se experiências de transformação
da assistência, pautadas no começo pela reforma intramuros das instituições
psiquiátricas (comunidades terapêuticas) e mais tarde pela proposição de um
modelo centrado na comunidade e substitutivo ao modelo do hospital
especializado.
Com a proclamação da Constituição, em 1988, cria-se o Sistema
Único de Saúde (SUS) e são estabelecidas as condições institucionais para a
implantação de novas políticas de saúde, entre as quais a de saúde mental.
Consoante com diversas experiências de reforma da assistência
psiquiátrica no mundo ocidental e as recomendações da Organização Pan-Americana
de Saúde (OPAS) contidas na Carta de Caracas (1990), o Ministério da Saúde, a partir
da década de 90, define uma nova política de saúde mental que redireciona
paulatinamente os recursos da assistência psiquiátrica para um modelo
substitutivo, baseado em serviços de base comunitária. Isto é, que
oferecem cuidados na comunidade e em articulação com os recursos que a
comunidade oferece. Incentiva-se a
criação de serviços em saúde mental públicos e territorializados (território é
a designação não apenas de uma área geográfica, mas das pessoas, das
instituições, das redes e dos cenários nos quais se dão a vida comunitária), ao
mesmo tempo em que se determina a implantação de critérios mínimos de adequação
e humanização do parque hospitalar especializado.
PNASH PSIQUIATRIA E PROGRAMA DE
REESTRUTURAÇÃO DA ASSISTÊNCIA
A
Política Nacional de Saúde Mental tem como uma das suas principais diretrizes a
reestruturação da assistência hospitalar psiquiátrica, objetivando uma redução
gradual, pactuada e programada dos leitos psiquiátricos de baixa qualidade
assistencial.
Esta
reestruturação da assistência hospitalar psiquiátrica acontece ao mesmo tempo
em que uma rede de atenção aberta e inserida na comunidade se expande. Ao mesmo
tempo em que leitos de baixa qualidade são fechados, um processo responsável de
desinstitucionalização de pacientes longamente internados passa a ter início,
com a implantação de Residências Terapêuticas e a
inclusão de beneficiários no Programa de Volta para Casa. Simultaneamente, uma
rede aberta e diversificada de atenção à saúde mental deve ser implantada, com
Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), Centros de Convivência e Cultura, ações
de saúde mental na atenção básica e programas de inclusão social pelo trabalho.
Deste
modo, a redução de leitos psiquiátricos no país segue um determinado ritmo, que
deve andar junto com a expansão dos serviços comunitários de atenção à saúde
mental. Esta redução gradual, pactuada e programada de leitos é realizada
através de 2 mecanismos, simultaneamente:
1
- Programa Nacional de Avaliação dos Serviços Hospitalares – PNASH/Psiquiatria
(PT GM 251, de 31 de janeiro de 2002) : este Programa já realizou vistorias em
todos os hospitais psiquiátricos públicos e conveniados ao SUS em 2002 e
2003/2004 e 2006/2007. Os resultados dos processos avaliativos indicam os hospitais
que apresentam sérios problemas na qualidade de assistência. Os problema mais
comuns referem-se ao projeto terapêutico dos pacientes e da instituição, aos
aspectos gerais da assistência (longo tempo de permanência, número alto de
pacientes longamente internados) e aos aspectos gerais dos pacientes (limpeza,
calçados e roupas, entre outros). Este instrumento gera uma pontuação que,
cruzada com o número de leitos do hospital, permite classificar os hospitais
psiquiátricos em quatro grupos diferenciados: aqueles de boa qualidade de
assistência; os de qualidade suficiente; aqueles que precisam de adequações e
devem sofrer revistoria; e aqueles de baixa qualidade, encaminhados para o
descredenciamento pelo Ministério da Saúde, com os cuidados necessários para evitar
desassistência à população.
2
- Programa Anual de Reestruturação da Assistência Hospitalar no SUS (PRH) – PT
GM 52, de 20 de janeiro de 2004 - A principal estratégia deste Programa é
promover a redução progressiva e pactuada de leitos a partir dos macro-hospitais
( hospitais com mais de 600 leitos, muitas vezes hospitais-cidade, com mais de
mil leitos) e hospitais de grande porte (com 240 a 600 leitos psiquiátricos).
Assim, são componentes fundamentais do programa a redução do peso assistencial
dos hospitais de maior porte, que tendem a apresentar assistência de baixa ou
péssima qualidade, e a pactuação entre os gestores do SUS, os hospitais e as
instâncias de controle
social, da redução planejada de leitos, evitando a desassistência. Desta forma,
procura-se conduzir o processo de mudança do modelo assistencial de modo a
garantir uma transição segura, onde a redução dos leitos hospitalares possa ser
planificada e acompanhada da construção simultânea de alternativas de atenção
no modelo comunitário. Para tanto, são definidos no Programa os limites máximos
e mínimos de redução anual de leitos para cada classe de hospitais (definidas
pelo número de leitos existentes, contratados pelo SUS). Assim, todos os
hospitais com mais de 200 leitos devem reduzir no mínimo, a cada ano, 40
leitos. Os hospitais entre 320 e 440 leitos podem chegar a reduzir 80 leitos ao
ano (mínimo: 40), e os hospitais com mais de 440 leitos podem chegar a reduzir,
no máximo, 120 leitos ao ano. Desta forma, busca-se a redução progressiva do
porte hospitalar, de modo a situarem-se os hospitais, ao longo do tempo, em
classes de menor porte (até 160 leitos).
Como
resultado destes mecanismos, foram retirados do sistema nos últimos anos leitos
de péssima qualidade assistencial. O perfil dos hospitais psiquiátricos mudou.
Se em 2002 apenas 24% dos leitos se localizavam em hospitais de pequeno porte
(com até 160 leitos), em 2007, cerca de 44% leitos em psiquiatria encontram-se
nestes hospitais.
PROGRAMA PERMANENTE DE FORMAÇÃO DE
RECURSOS HUMANOS PARA A REFORMA PSIQUIÁTRICA
Desde o ano de 2002, O Ministério da
Saúde desenvolve o Programa Permanente de Formação de Recursos Humanos para a
Reforma Psiquiátrica. São ações deste programa:
• Incentivo, apoio e financiamento da implantação de núcleos de formação em
saúde mental para a rede pública, por meio de convênios estabelecidos com a
participação de instituições formadoras (especialmente universidades federais),
municípios e estados. Existem 21 Núcleos Regionais de Formação em Saúde Mental
para a Rede Pública já implantados, que realizam cursos de especialização e
atualização em saúde mental para trabalhadores da atenção básica e dos CAPS. Ao
todo, 29 cursos de especialização em saúde mental e 74 cursos de capacitação em
saúde mental e álcool e outras drogas estão em funcionamento no país.
• Estímulo à Supervisão Clínico-institucional dos CAPS, por meio de editais
para Projetos de Qualificação dos CAPS (acesse a PT MS/GM 1174/2005, em anexo).
Desde sua criação, em 2005, até outubro de 2008, 367 serviços, distribuídos em
todos os estados brasileiros, receberam repasses para o desenvolvimento do
Programa.
• Apoio aos Programas de Residência Multiprofissional em Saúde Mental. Já
existem três programas em andamento nos estados da Bahia, Rio Grande do Sul e
Rio de Janeiro. Também está em andamento a primeira residência em psiquiatria
mantida diretamente por uma rede municipal de cuidados em Saúde Mental, a
Residência Médica em Psiquiatria do município de Sobral (CE). Esta rede conta
com o apoio do Ministério da Saúde, além de Universidades Públicas.
• Fomento e apoio a projetos que aceleram e consolidam o processo de
reorientação da assistência em saúde mental. Em 2008, foi inaugurada a Escola
de Saúde Mental do Rio de Janeiro, por meio de uma cooperação
interinstitucional entre o Ministério da Saúde, a Prefeitura do Rio e a
Universidade Federal do Rio de Janeiro. A escola formará novos quadros técnicos
e vai educar de modo permanente a força de trabalho da rede pública de saúde
mental do estado e municípios do Rio de Janeiro.
Supervisão Clínico-Institucional
O
ofício da supervisão e sua importância para a rede de saúde mental do SUS
Exercido por profissionais de formação teórica e prática diversas, o ofício da
supervisão apresenta algumas características comuns, no entendimento da CNSM,
apresentadas a seguir:
1.
A supervisão deve ser "clínico-institucional", no sentido de que a
discussão dos casos clínicos deve sempre levar em conta o contexto
institucional, isto é, o serviço, a rede, a gestão, a política pública. Assim,
ao supervisor cabe a complexa tarefa de contextualizar permanentemente a
situação clínica, foco do seu trabalho, levando em conta as tensões e a
dinâmica da rede e do território. Em outras palavras: buscando sustentar o
diálogo ativo entre a dimensão política da clínica e a dimensão clínica da política.
2.
Escolhido pelo município onde se localiza o serviço e a rede, espera-se que o
supervisor inicie sua tarefa contando com condições propícias de acolhimento
pela equipe, de modo a também acolhê-la em suas dificuldades, tensões internas,
sobrecarga, construindo um ambiente de trabalho favorável. Estudos (em
relatórios preliminares) do edital
MS/CNPq 2005 vêm mostrando que as equipes dos CAPS têm uma representação
positiva de seu trabalho, mas se mostram muito desgastadas com as dificuldades
concretas da gestão pública (somadas à complexidade da tarefa clínica que
realizam). Cabe ao supervisor
compreender esta dinâmica, desvelando-a para a equipe – multidisciplinar,
heterogênea, com tradições teóricas diversas e fenômenos grupais inevitáveis -,
de modo a ajudar no andamento da vida do serviço e na construção permanente do
trabalho da equipe (marcado por vitalidade e conflito).
3.
Qualquer que seja sua tradição teórica predominante, cabe ao supervisor
enfrentar ele mesmo o desafio do novo cenário de sua prática (o CAPS e a rede pública de saúde),
ajudando a equipe a buscar permanentemente, em cada caso clínico, a construção
dos conceitos operativos de rede (de serviços de saúde, de outras políticas
intersetoriais, familiar, social, cultural, laboral) e de território (o lugar
da vida do sujeito, suas características culturais, suas interações
significativas). Sujeito, rede e território articulam-se no projeto terapêutico, cujo
objetivo final é ajudar o serviço e a rede a apoiarem o paciente e sua família
na construção da autonomia possível.
4.
Este "novo cenário" da prática do supervisor é o espaço social
concreto e histórico da vida dos sujeitos e da instituição, no âmbito de uma
política pública, o SUS. O supervisor deve trabalhar na direção da construção
do SUS, buscando sempre vencer a dicotomia, que com freqüência se instala,
entre as diretrizes gerais da política e a construção particular do cuidado
clínico, que seja capaz de levar em conta a complexidade da dimensão
existencial de um sujeito singular em um determinado território.
5.
As 3 dimensões referidas (a supervisão como clínica e institucional; a
integração da equipe de cuidado; e a construção do projeto terapêutico
articulando os conceitos de sujeito, rede, território e autonomia) são características
da tarefa da supervisão, e perfeitamente harmonizáveis com formações teóricas
diversas (desde que o supervisor esteja aberto a exercer sua competência
clínica no cenário peculiar da rede pública de saúde mental). Mas este desafio
– de exercer a competência técnica no cenário da saúde pública, harmonizando as
diversidades profissionais e teóricas - não é só dos supervisores, mas uma
condição para o êxito mais permanente da Política Nacional de Saúde Mental.
6.
Embora recente, a supervisão clínico-institucional em saúde mental já tem uma
história. É uma prática que surge no contexto dos inicialmente chamados
"serviços substitutivos", que hoje integram a rede de atenção
psicossocial. Os novos supervisores precisam apropriar-se desta história, da
política nacional de saúde mental, dos problemas e desafios dos novos serviços,
do contexto do SUS. Inicialmente, sugerimos, para aqueles que não os conhecem, a leitura de um conjunto de
documentos básicos da política (Manual dos CAPS, Relatório de Gestão 2003-2006,
Relatório Final da III Conferência Nacional de Saúde Mental, Saúde Mental e
Economia Solidária, Saúde Mental da Criança e Adolescente, Legislação de Saúde
Mental, WHO-AIMS Report Brazil 2007), facilmente acessíveis no endereço
www.saude.gov.br/bvs/saudemental.
Em seguida, vale a pena familiarizar-se
com a recente produção teórica em torno do trabalho dos CAPS, da rede de
atenção psicossocial e do próprio ofício de supervisão.
7.
Para propiciar um diálogo viável e permanente, o Ministério da Saúde está buscando
concretizar a proposta de uma "Escola de Supervisores", nascida do I
Congresso Brasileiro de CAPS (São Paulo, 2004), um dispositivo capaz de
permitir a difusão e intercâmbio do ofício de supervisor. Uma
"Escola" aberta, pública, que permita a articulação entre os
supervisores dos diversos territórios do país.
Atenciosamente,
Coordenação Nacional de Saúde Mental, Álcool e Outras Drogas
Programa Nacional
de Avaliação de Centros de Atenção Psicossocial - AVALIAR CAPS
O
Programa Nacional de Avaliação de Centros de Atenção Psicossocial - AVALIAR
CAPS - apresentou sua terceira edição em 2008.
O
programa tem como objetivos o levantamento de informação sobre estes serviços,
possibilitando a caracterização dos CAPS, o acompanhamento, a estimativa de
qualidade da assistência prestada e a proposição de indicadores.
O
AVALIAR CAPS é uma iniciativa da Área Técnica de Saúde Mental do Ministério da
Saúde, que utilizará o instrumento de avaliação para o acompanhamento
sistemático e permanente. Este ano, o questionário está disponibilizado em meio
eletrônico (FORMSUS/DATASUS), o que torna mais ágil seu recebimento, o
preenchimento e a devolução, evitando perda de informação e possibilitando mais
rapidez no tratamento dos dados.
O
teste piloto foi aplicado em uma amostra de 10% dos CAPS, ou 120 serviços do
país. Após a consolidação dos resultados, no mês de outubro, foi construído o
questionário permanente, aplicado entre novembro e dezembro de 2008, com uma
etapa de recoleta em janeiro de 2009, na totalidade dos serviços CAPS.
O
Programa de avaliação da qualidade e monitoramento dos CAPS se constitui em um
instrumento de gestão, de indução da produção de informação nos serviços e uma
oportunidade para uma atitude reflexiva diante das práticas cotidianas nos
serviços de saúde mental.